terça-feira, 6 de abril de 2010

Letra financeira ainda encontra resistência entre os investidores


Bastante ansiadas pelos bancos, as letras financeiras caminham a passos mais lentos e enfrentam mais dificuldades para serem vendidas aos investidores do que as instituições financeiras previram inicialmente.
Concebidas pelos bancos e pelo governo como instrumento de captação de longo prazo para o sistema financeiro, as letras foram lançadas por medida provisória há três meses. Mas, até agora, as poucas sondagens de emissões que chegam às mesas dos investidores têm formato de balão de ensaio, com volume máximo de R$ 50 milhões, valor bem distante dos cerca de R$ 15 bilhões que os bancos estimavam emitir por ano, conforme relataram ao Valor quatro investidores qualificados - dois fundos de pensão e dois fundos de investimento. De concreto, só chegou a eles até agora uma oferta de papéis do Citibank.
Foto Destaque
E, por enquanto, as letras ainda não caíram no gosto dos investidores. "Hoje, o entrave das letras financeiras passa pela definição de preço. O investidor não está vendo vantagem em comprar uma letra em relação aos outros papéis emitidos por banco", diz Gustavo Summers, superintendente de gestão de balanços do Santander.
Em grande parte, isso de deve à forma como as letras financeiras foram formatadas pelo Banco Central, segundo bancos e investidores. Assim como nos Certificados de Depósito Bancário (CDB), os bancos devem recolher o depósito compulsório sobre as emissões, o que para o banco não é vantajoso. Além disso, a regulamentação só permitiu que as letras contem como capital para os banco se forem vendidas para investidores qualificados - e não via ofertas públicas, que, espera-se, devem representar o maior volume.
Do lado do investidor, há duas características que podem ser encaradas como desvantagens em relação ao CDB: não têm a cobertura do Fundo Garantidor de Crédito e não podem ser recompradas a qualquer momento pelo emissor.
"Por enquanto, as letras estão mais atrativas para os bancos do que para os compradores", afirma Fabio Monaco, gerente de renda fixa da Fundação Cesp, quarto maior fundo de pensão do país.
Além de a letra ser um título novo, ainda não existe um mercado de revenda do papel, o que tem levado o comprador a pedir uma taxa maior ante os CDBs. Na outra ponta, os bancos não estão dispostos a pagar um prêmio alto. "Pretendemos fazer uma emissão, mas não vamos conseguir pagar o que está sendo pedido", diz Summers, doSantander.
Uma instituição de grande porte que pretende emitir R$ 50 milhões em uma emissão privada relatou que hoje o preço pedido pelos investidores torna o repasse dos recursos captados a seus clientes mais caro do que se eles próprios lançassem debêntures. Dois bancos relataram que pretendem fazer captações com taxas em torno de 106% e 107% do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI).
As letras financeiras, uma espécie de debênture dos bancos, foram bastante aguardadas pelas instituições financeiras por serem um instrumento de captação de longo prazo no mercado doméstico, em um cenário de expansão do crédito. Até dezembro, apenas as empresas não-financeiras podiam emitir títulos mobiliários de dívida entre os investidores brasileiros. "A letra é um título muito bem intencionado, mas faltou combinar com os investidores", avalia Jorge Libiani, diretor-executivo do banco Bonsucesso.
Soma-se a isso o fato de o sinal verde para as letras financeiras ter coincidido com um período em que os bancos brasileiros estão nas graças dos investidores estrangeiros depois que saíram ilesos da crise econômica mundial. Bradesco, Santander e Itaú, por exemplo, anunciaram captações externas. "É uma questão de taxa. Os bancos brasileiros caíram no gosto do investidor internacional, por isso estão preferindo seguir a receita de bolo em vez de testar as letras", diz Eduardo Castro, advogado do escritório Machado Meyer.
Entretanto, nem bancos nem investidores acreditam que esse descompasso inicial signifique o fracasso das letras financeiras. Para Paulo Vaz, diretor de tesouraria doItaú BBA, os novos papéis vão acabar roubando um pouco do espaço dos CDBs com prazo mais longo. "As colocações de CDBs são feitas muito caso a caso. É um mercado bem menos transparente do que aquele que a letra pretende criar", diz. Os bancos médios, mais carentes de fontes de financiamento, esperam o desenvolvimento desse mercado. "Para as instituições menores, as letras devem se transformar em fonte muito importante de captação", avalia Clive Botelho, conselheiro da ABBC, a associação dos bancos médios.
De acordo com Marina Procknor, sócia do escritório de advocacia Mattos Filho, por enquanto os bancos estão apenas sondando o terreno. "Isso é normal no lançamento de qualquer novo instrumento."
Outro impulso para as letras deve vir da definição por parte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de regras para as ofertas públicas desses papéis, ainda sem data para publicação. Segundo Luciana Dias, superintendente de desenvolvimento de mercado da autarquia, como os bancos já são supervisionados pelo Banco Central, pode ser que eles venham a ficar livres do registro de companhia aberta. "Mas estamos checando se as informações prestadas ao Banco Central são suficientes para se fazer uma venda pública."

Nenhum comentário:

Postar um comentário