quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Agora, Belda caça empresas

O fundo de private equity americano Warburg Pincus chega ao país pelas mãos do ex-presidente mundial da Alcoa Alain Belda e aumenta a lista dos recém-chegados ao mercado brasileiro -- um dos que mais crescem no mundo.
O ano de 2009 estava marcado na agenda do executivo Alain Belda, de 66 anos, como o da chegada da aposentadoria e da volta ao Brasil. Após 40 anos de trabalho na fabricante de alumínio americana Alcoa -- 14 deles vivendo nos Estados Unidos e sete como presidente mundial da empresa --, Belda havia programado dividir seu tempo entre a casa que construiu no bairro Jardim Europa, área nobre de São Paulo, e os compromissos no exterior como conselheiro do Citigroup, da IBM, da Renault e da própria Alcoa. Em janeiro, porém, a gestora de private equity americana Warburg Pincus, a nona maior do mundo, o convidou para liderar sua operação no Brasil. Em meados do ano, Belda já havia se desligado das atividades executivas da Alcoa para assumir, de um novo escritório em São Paulo, os investimentos da Pincus na América Latina. "Só adiaria a aposentadoria por um projeto como este: montar um negócio do zero com gente jovem e motivada", diz. Por enquanto, ele dedica boa parte de seu tempo à procura de um endereço e à montagem da equipe -- mas a caça por empresas já começou.

Esta será a segunda investida do fundo no mercado brasileiro. Nos anos 90, sem uma base local, a Pincus investiu em companhias de mídia e tecnologia que naufragaram -- e foi embora. Agora, com um time local, pretende aplicar cerca de 1,5 bilhão de reais no Brasil e nos países vizinhos num prazo de cinco anos. Nas suas quatro décadas de Alcoa, Belda acumulou uma vasta experiência na compra de empresas -- participou de cerca de 20 aquisições. "A diferença é o objetivo do investimento. Quando uma empresa compra outra, a união tende a ser permanente. No caso de um private equity, é preciso pensar em prazos curtos, de cerca de cinco anos", diz. Apesar de estar há anos fora do país, Belda transita bem no ambiente empresarial brasileiro. Entre os seus melhores amigos estão Elie Horn, dono da construtora e incorporadora Cyrela, e Carlos Jereissati, fundador da Iguatemi Empresa de Shopping Centers, uma das maiores da América Latina. "Acho que tenho uma boa reputação. Para quem vai receber um fundo de investimento como sócio, confiança é fundamental", diz Belda.

A chegada do Warburg Pincus ao país faz parte de um movimento maior. O setor de private equity, especializado em comprar participação de companhias promissoras para revendê-las por um preço maior no futuro, vive um momento de renovação no Brasil. Diversas instituições nacionais e internacionais estão, neste momento, lançando fundos por aqui. O Kohlberg Kravis Roberts (KKR), quarto maior fundo do mundo, analisa o mercado brasileiro desde o começo do ano passado. "Gostaríamos de investir no Brasil ainda em 2009 ou, no máximo, em 2010", diz John Pfeffer, um dos sócios do fundo baseados em Londres. Ele visita o Brasil a cada dois meses e está aprendendo português há cerca de um ano. Hoje, a única ligação do KKR com o mercado local é indireta -- o fundo tem uma participação no grupo americano de educação Laureate, que no Brasil controla a Universidade Anhembi Morumbi, entre outras. "Normalmente, aplicamos entre 250 milhões e 750 milhões de dólares em cada negócio. Mas estamos considerando investimentos um pouco menores no Brasil", diz Pfeffer. Se tudo correr como o planejado, em breve KKR e Warburg Pincus deverão constar do primeiro pelotão do mercado brasileiro -- hoje, os maiores fundos de private equity do país são o americano Advent e os brasileiros Gávea, GP Investimentos e Pátria.

Esse movimento de atração de gigantes do mercado internacional está intimamente ligado à conjuntura macroeconômica brasileira. A queda da taxa de juro, a ascensão da baixa renda e o aumento no grau de formalização das empresas tornaram o ambiente econômico muito mais atrativo -- e abriram espaço para a expansão e o surgimento de empresas nos mais diversos segmentos. Não faltam, portanto, oportunidades para gestores que queiram aportar dinheiro e gestão em companhias emergentes. Dados da Fundação Getulio Vargas mostram que o setor de private equity no Brasil vem crescendo à média de 53% ao ano desde 2004 -- uma das maiores taxas de expansão do mundo, em parte explicada pelo modestíssimo ponto de partida, em parte pela expectativa positiva em relação ao futuro. "Os investidores perceberam que o Brasil está vivendo mudanças seculares que vieram para ficar", diz Fernando Oliveira, sócio responsável pela América Latina do americano General Atlantic, um dos que chegaram há pouco tempo. A vinda em peso dos fundos para o Brasil é mais significativa por ocorrer num momento em que não faltam oportunidades também em outros mercados. Nos Estados Unidos, apesar do clima de cautela ainda reinante, há muitos negócios de vulto sendo fechados. Em outubro, o fundo Blackstone pagou 2,7 bilhões de dólares pelos parques temáticos da cervejaria ABInBev, que incluem os três SeaWorld, a maior operação de private equity no mundo neste ano.

Na comparação com outros países emergentes, o setor ainda engatinha no Brasil. Por aqui, a captação anual de recursos para novos investimentos é apenas um décimo da chinesa e um terço da indiana. A presença dos grandes fundos internacionais também é limitada -- dos dez maiores gestores mundiais, apenas o Carlyle já estava no país e, mesmo assim, ainda não fez nenhum grande negócio. Com os anúncios do Warburg Pincus e do KKR, a expectativa agora é que aumente o número de grandes fundos e que o setor ganhe novas nuances. O americano Burrill & Company, um recém-chegado que montou um escritório no Rio de Janeiro, acredita na especialização. Está captando recursos para aplicar exclusivamente em empresas de biotecnologia. "Na nossa maneira de ver, é difícil trabalhar sem ter os conhecimentos específicos", diz Steven Burrill, presidente mundial da Burrill & Company. Na equipe brasileira, haverá cientistas especializados em áreas como o estudo de células-tronco. A ideia é que eles possam avaliar tecnicamente a qualidade das empresas potencialmente interessantes.

Na cadeia alimentar do private equity, o processo começa quando um fundo compra uma participação ou o controle de uma empresa. Em seguida, com a injeção de capital e, em alguns casos, também com a intervenção na gestão, o fundo acelera o processo de crescimento do negócio e, anos depois, procura sair com lucro. As principais vias de saída são a venda de sua parte ou do controle para um concorrente, um novo investidor estrangeiro ou via bolsa de valores. Os gestores do fundo 2bCapital, formado em agosto pelo Bradesco e pelo Banco Espírito Santo, querem acrescentar um novo estágio a essa cadeia alimentar. Pretendem vender participações para outros fundos semelhantes. São sinais de um mercado que amadurece rapidamente. No que depender do cenário atual do private equity brasileiro, a volta de Belda a São Paulo vai ser bem mais movimentada do que o planejado.

Fonte: Portal Exame

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