terça-feira, 21 de dezembro de 2010

De carona na inflação

Os fundos de investimento que seguem índices de preços voltaram à baila no último ano com o aumento das pressões inflacionárias. Levantamento da consultoria Quantummostra um crescimento superior a 100% em 2010 do patrimônio das carteiras que seguem o Índice de Mercado Anbima B (IMA-B), que considera a rentabilidade média das NTN-B, títulos públicos que pagam a variação do IPCA mais juros. Em 2009, havia 23 desses fundos com R$ 11,5 bilhões em ativos sob gestão. Neste ano, até dia 16 de dezembro, já eram 32, com R$ 24,2 bilhões.
Mais do que preservar o capital no longo prazo, o investidor que buscou esse tipo de aplicação neste ano foi atraído pela economia aquecida e pela perspectiva de inflação maior, aponta Sandra Petrovsky, superintendente de investimentos da Votorantim Asset Management(VAM). "O investidor quis se proteger da inflação corrente, de curto prazo." O estudo da Quantum mostra captação líquida do segmento superior a R$ 10 bilhões em 2010 até o último 16, bem acima do R$ 1 bilhão de 2009.
As expectativas do mercado para a inflação começaram a oscilar demais no último ano, espalhando preocupação entre os investidores, ressalta Ronaldo Patah, superintendente de renda fixa do Itaú Unibanco. Ontem, no Boletim Focus, que traz projeções de analistas consultados pelo Banco Central (BC), a estimativa para o IPCA deste ano foi ampliada pela 14ª vez, para 5,88%. Para 2011, a projeção subiu pela segunda vez, para 5,21% - bem acima da meta de 4,5% estipulada pelo BC.
"Como o investidor pessoa física é imediatista, ao se deparar com uma oportunidade com perspectiva de ganhar mais que o CDI, ele a agarrou", afirma o executivo responsável pelas áreas de renda fixa e investimentos alternativos da Schroders Brasil, Marcos De Callis, referindo-se ao aumento da procura por fundos de inflação. E, na visão dele, esse comportamento do investidor, lamentavelmente, vai durar enquanto a rentabilidade desses fundos estiver acima do CDI, o juro interbancário.
Nos últimos dois anos, as aplicações atreladas à inflação deixaram o CDI para trás. Em 2009, o retorno médio dos fundos IMA-B foi de 13,25%, ante 9,88% do CDI. Neste ano, até o dia 16, a rentabilidade acumulada chega a 15,38%, ante 9,27% do juro interbancário.
Ao longo de 2010, foram pelo menos três momentos distintos para os índices de preços. Os dois primeiros meses começaram com inflação mais forte por questões sazonais como reajuste de aluguéis e escola, além da alta de preços de alimentos por fatores climáticos. Em março, abril e maio, a inflação voltou para a casa do 0,5%, chegando a zerar em junho, julho e agosto. Já em outubro, os preços voltaram a pressionar.
Patah, do Itaú, afirma que o cenário econômico vem mudando com muito mais frequência do que no passado. Primeiro, por conta da globalização, e a crise de 2008 evidenciou o poder de contaminação dos mercados mundo afora. Depois, pela maior importância do Brasil no mercado global e sua influência no segmento de commodities, de agrícolas ao minério de ferro e petróleo.
Além da busca por proteção, outro fator que levou o investidor a migrar para fundos indexados a índices de preços foi o juro real (taxa descontada a inflação) relativamente alto pago pelas NTN-Bs. Com a estabilização econômica, a taxa Selic caiu para níveis historicamente baixos, levando o investidor a olhar para o ganho real. "Essa visão é bastante saudável para sairmos de vez da cultura do CDI", diz Sandra, da Votorantim.
De Callis, da Schroders, destaca que essa percepção é mais comum entre investidores institucionais, como fundos de pensão. "É o institucional que quer capturar o fechamento (redução) do cupom no médio e longo prazo, até porque ele tem metas atuariais atreladas a índices de preços."
Ele alerta, contudo, que a pessoa física também deveria olhar para o juro real, e não apenas para a inflação de curto prazo, e manter uma parcela de seu patrimônio nesse tipo de aplicação para participar do ganho a ser gerado pela redução do juro real no longo prazo. "Talvez essa seja uma das poucas oportunidades que ainda restam no mundo de comprar um papel que protege da inflação e ainda paga um cupom perto de 6% ao ano, um dos maiores se comparado a mercados desenvolvidos e mesmo emergentes. ", diz.
No Itaú, destaca Patah, o economista Ilan Goldfajn estima que o juro real caia abaixo de 5% no médio prazo. O próprio governo sinalizou que quer levar essa taxa para 2% em 2014. Neste ano, os fundos IMA-B e outras carteiras que aplicam em títulos atrelados à inflação, além de terem protegido o investidor da pressão de preços corrente, já ofereceram esse ganho adicional com o juro real pago pelas NTN-Bs, valorizando o preço desses papéis.
A NTN-B com vencimento em 15 de novembro de 2011 pagava no início do ano IPCA mais 6%. Hoje, esse cupom está em 5,5%. No caso da NTN-B para 15 de agosto de 2012, o cupom caiu de 6,5% para 5,9%. O IMA-B 5, índice que considera a rentabilidade das NTN-Bs com até cinco anos de prazo, variou 11,53% em 2010 até o fim de novembro. Já o CDI registrou alta de 8,74%.
Mas mesmo num horizonte de curto prazo, os especialistas ainda acreditam que há oportunidades. De Callis, da Schroders, diz que a inflação deve permanecer pressionada pelos próximos meses. Sandra, da Votorantim, compartilha a opinião de que ainda vale a pena continuar nesse tipo de investimento na carona das pressões inflacionárias esperadas para 2011. "Vale a pena tanto para se proteger da inflação corrente quanto para o carregamento, a fim de ganhar com a redução do juro real ao longo do tempo", diz Sandra.

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